PARAR O TEMPO, porque quando uma história é contada não é esquecida. Torna-se outra coisa. A memória de quem fomos. E do que podemos vir a ser.
Naquele dia aquela rua parecia-nos alegre e com tudo o que podíamos desejar. Estávamos em Abril de 1986 e a Ana estava com uma grande indecisão - será que devia concorrer ao Centro de Estudos Judiciários ? Será que tinha perfil para ser Juiz ? Não queria contar a ninguém. Muito menos aos pais porque o processo de entrada era muito difícil e não queria dar falsas expectativas.
Mas aquele dia estava muito agradável e, no fundo, sentíamos algo de diferente - era como se caminhássemos também uma estrada imaginária em direção a um futuro que estava mesmo à nossa frente, pronto para ser construido. Foi com esse espírito que encontrámos o café Copa D'Ouro. Aí serviam-se os melhores mariscos e estava cheio de pescadores que muitas vezes traziam o produto da pesca, para eles próprios almoçarem.
"O menina isso de ser juiz não é para pessoas mais velhas ?" O ambiente era familiar e apesar de sermos de Lisboa os donos gostavam de meter conversa. A Ana não era desse tipo mas eu sempre gostei de dar "corda" e arrancar umas gargalhadas . "Isso era no tempo da outra senhora", Ana disse-lhe eu com um sorriso de jovem animado pela nossa entrada recente na Europa. E lá continuámos a nossa conversa sobre isso de ser Juiz.
"Diz-se Juiz ou Juiza ?" perguntei eu , sempre naquela vontade de descobrir coisas novas. "Não sei nem quero saber, o problema é que, se entrar, vou ter de ir para a província muitos anos , lá para as "berças" ou para as ilhas ... ". O meu sorriso e boa disposição sofreu um pouco, confesso. Fiquei pensativo e um pouco aflito. Sabia como a Ana, filha única, não lidava bem com estar sozinha, longe da família e agora do seu namorado. "Mas se gostavas mesmo de ser Juiz não penses nisso que tudo se vai compor, vais ver!". Nunca mais me esquecerei do seu fantástico sorriso que ainda hoje me apaixona. No fundo fiz-lhe a vontade de dizer o que ela precisava de ouvir. E assim foi tomada a nossa grande decisão e que ainda hoje não nos arrependemos. Ela ia ser juiz e naquele Café D´Ouro tudo parecia entrar nos eixos . O casamento podia começar a ser desenhado, os filhos a seguir - é preciso ter coragem para crescer !
No Café D´Ouro ficou um momento único e do qual ainda temos uma foto. A vida é um começo permanente. Pequenas histórias tornam esses momentos mais reais , quase que os podemos saborear, e alimentam o espírito!
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